Para conceitualizar a palavra "cidade", escolhemos um pensador muito famoso, chamado Raymond Williams.
Ao retornar para Cambridge, após servir o exército inglês na II Guerra Mundial, o escritor e crítico literário estranhou o novo e múltiplo sentido de uma palavra antes pouco usada: cultura. Dessa inquietação com os diferentes sentidos e usos dos termos, além da preocupação com a falsa neutralidade do vocabulário e dos dicionários, nasceu o projeto que resultou em Palavras-chave: um vocabulário de cultura e sociedade, até hoje inédito no Brasil.
Gostamos tanto desse conceito, que vale a pena ler:
CIDADE
"City existe no inglês desde o século 13, mas seu uso moderno característico para referir-se a uma cidade grande ou muito grande, e seu uso correspondente para distinguir as áreas urbanas das áreas rurais ou do campo (country), datam do século 16. Essa última referência e distinção obviamente tem relação com a importância crescente da vida urbana do século 16 em diante, mas até o século 19 seu uso ficou reservado sobreturo à cidade capital, Londres. O uso mais geral corresponde ao rápido desenvolvimento da vida urbana durante a Revolução Industrial, o que, por volta de meados do século 19, fez com que a Inglaterra se tornasse a primeira sociedade da história mundial na qual a maioria da população vivia em cidades.
City se derica da p.i. cité, do francês antigo, e da p.r. latina civitas. Mas civitas não era cidade no sentido moderno; para isso havia a palavra urbs. Civitas era o substantivo geral derivado do latim civis - cidadão, que se aproxima do nosso sentido moderno de "nativo". Civitas era, portanto, antes do conjunto de cidadãos do que um assentamento o uum tipo de assentamento específicos. Assim a empregavam os escritores romanos para referir-se às tribos da Gália. Em um longo e complicado desenvolvimento, civitas e seus derivados especializaram-se para designar a principal cidade de um Estado e, no uso eclesiástico, a cidade sede de uma catedral. As palavras inglesas usadas anteriormente eram borough (bugo, município) e town (cidade), ambas do inglês antigo. Town desenvolveu-se a partir de seu sentido original de cercado ou recinto para um grupo de edifícios dentro desse cercado (como tal, sobrevive em alguns nomes modernos de aldeias e distritos rurais) até o início de seu sentido moderno no século 13. Burgo e cidade tornaram-se com frequência intercambiáveis, e há várias distinções legais entre eles em diferentes períodos e tipos de governo medieval e pós-medieval. A partir do século 16, uma das diferenciações de cidade era a presença de uma catedral, e ainda hoje é usada de modo residual, apesar de errôneo. Quando city começou a distinguir-se de town em termos de tamanho, principalmente a partir do século 19 - mas com precedentes em relação ao predomínio de Londres desde o século 16 -, cada uma era ainda administrativamente um borough (burgo) e essa palavra se especializou para designar uma forma de governo ou de administração local. Seja como for, desde o século 13, city tornou-se uma palavra mais digna que town; e assim foi utilizada muitas vezes para referir-se a Londres e, no século 17, os contrastes entre cidade e campo eram muito comuns. City, no sentido especializado de centro financenro e comercial, derivado de sua real localização na cidade de Londres, foi amplamente usado desde o início do século 18, quando a atividade financeira e comercial se expandiu de modo notável.
A cidade como uma ordem de assentamento realmente característica, sugerindo um modo totalmente de vida, não se estabelece de forma completa, com suas conotações modernas, até o início do século 19, embora a idéia tenha uma história muito longa, desde o pensamento renascentista e até mesmo clássico. A ênfase moderna pode ser rastreada na palavra, na crescente abstração de cidade como um termo relativoa lugares ou formas administrativas específicas, e na crescente generalização das descrições da vida urbana moderna em grande escala. Assim, a cidade moderma com milhões de habitantes distingue-se, via de regra, ainda que indefinidamente, de diversas características de períodos e de tipos de assentamento mais antigos. Ao mesmo tempo, a cidade moderna subdividiu-se, como no uso do contemporâneo cada vez mais frequente de centro de cidade (inner city), termo que se tornou necessário por causa da mudança de status de subúrbio. Desde o século 17, o subúrbio era uma zona exterior e inferior, e o sentido persiste em alguns usos de suburbano para referis-se à estreiteza de idéias. A partir do final do século 19, porém, houve uma mudança de classe nas áreas preferenciais: os subúrbios, atraíram residentes e o centro da cidade passou a abrigar escritórios, lojas e habitantes pobres."
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